Confesso
que sou uma pessoa muito medrosa. Diria que até mesmo, como uma pessoa que
tenta pensar, procura pensar, alguém que tem mais medos do que o normal, na
medida em que se preocupa mais, estuda mais os diversos ângulos dos perigos. E
perigos há muitos que a vida é uma aventura perigosa por mais tranquilo que
seja você e por mais paz que deseje na vida. Aqui lembro, imensamente de meu
pai, que repetia um bordão para nos incitar a sermos corajosos “Ou mato ou
morro! Ou me escondo no mato ou escalo o morro!”. Aliás, dele há uma poesia que
lembra muito o significado do heroísmo, cujos os versos, numa linguagem antiga,
são reveladores: “No sucavão da glória! No sucavão da glória, eu vi as cuecas
do herói”. Esta rememoração provém de que, como os chineses, meu pai dizia que “briga
não é um comportamento de pessoas civilizadas” e aconselhava a correr delas,
todavia, como os chineses, recomendava que
entre “eu” e “você” não existe alternativa, ou seja, nas situações extremas não
é uma questão mais de ter medo, é uma questão de sobrevivência . Pensava nisto,
com a morte de alguns amigos, de um grande amigo, em particular, o Carlinhos Toledo,
com esta epidemia do vírus, do novo coronavírus. Quando o inimigo é imponderável
e nos rouba coisas preciosas, como compartilhar a convivência, beber e rir
juntos, abraçar uma pessoa querida, um amigo, não se tem também alternativas.
Nestes meses de isolamento, com as restrições que ainda temos, mesmo que
relaxadas, tivemos que relaxar o desejo tão acalentado de retomar a velha forma
de vida, que continua a ser apenas um desejo. Por mais que queiramos, parece
improvável que se possa usar o mundo, lá de fora, como no passado: a magia das
saídas noturnas, dos bares, do futebol, dos jantares, da curtição do espaço
público, do ar livre, de passear entre outras pessoas, por mais tentador que
seja, é um risco, um grande risco. E, olhando para os que se foram, não há como
não pensar na nossa vulnerabilidade, pensar que hoje estamos aqui, mas, tudo é
tão rápido, tão fluído, tão frágil que, amanhã se foi, que nem teremos mais
consciência da luz, da cor, da beleza do calor do qual tanto reclamamos e até
da fumaça que nos faz respirar pior. Sei que já me perdi neste mar de
pensamentos bobos- e a bobagem também faz parte da humanidade. Mas, é que, de
qualquer modo, o isolamento me lembrou de uma verdade óbvia: não preciso nem
sair de casa, nem ficar imerso na
televisão ou na internet, para me divertir. Voltei ao velho hábito de ler
muito, que, com os whatssaps, os Facebooks, e-mails e sites tinha
negligenciado. Adquiri, novamente, o velho hábito de beber vinho, duas taças,
meia garrafa, no máximo, com sorvete e até me deixei ficar mais na cama, sem ter
o que fazer, só pelo prazer de me espreguiçar, de curtir o prazer de não fazer
nada. Esqueço o micro desligado, o celular e até as horas. Nada mais de me
ligar no noticiário (excessivo nas notícias ruins), nem no econômico. Até
arranjei uns mantras para meditação. E só busco falar, fazer coisas que me dão
prazer, e bem devagar. E escrevo. Escrevo muito. Escrever, no entanto, é uma
forma de prazer. E a vida? A vida está mais leve. É bom flutuar nela como uma
pena ao vento. E lá vamos nós!
Ilustração:
http://faceafaceblog.blogspot.com/.
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