Que nós vivemos numa época de
excesso de informações ninguém tem muita dúvida. A sucessão de imagens, de
slogans, de publicidades e de propagandas que nos perturbam só é menor que a
nossa procura incessante de estar à par do novo, de não perder a onda da
modernidade, de, enfim, saber do que se passa em todo canto, todo tempo. Lembro
que, garoto (claro que no século passado, seus implacáveis) não existia esta
volúpia da notícia, o que nos poupava, por exemplo, das páginas sangrentas dos
jornais, dos sequestros, dos crimes ou até mesmo de saber que existiam tantos
criminosos, em especial, dos cofres públicos. Ladrão era ladrão mesmo, de
galinha que fosse, mas, reconhecido na profissão e com, um traço que, hoje,
infelizmente se perdeu, de ser uma coisa vergonhosa. O estereotipo do ladrão
era sempre o de estar mascarado e carregar consigo um saco para levar as coisas
roubadas. Era um tempo de inocência onde, visivelmente, não acontecia nada ou,
se acontecia, era devagar, devagar, devagarinho, como recomendou, sabiamente,
Martinho da Vila. A vida tinha tempo, estações, processos lentos para
acontecer.
Hoje a vida parece acontecer a
toda hora. O celular nos localiza e nos faz trabalhar onde quer que estejamos.
Os notebooks, smartphones e laptops surgem nos lugares mais inesperados e a
intromissão da informação não respeita mais nem os limites dos tribunais, das
salas de aulas e dos templos. Aliás, até mesmo a missa, a aula virou um espetáculo
onde, se não houver tecnologia, adeus atenção. Por tudo isto a leitura parece
algo perdido no passado. Até mesmo para mim, um leitor ávido e empedernido, que
lia sem cessar, oito a dez livros por semana, me surpreendo verificando que só
leio dois, três e já não faço, como no passado, aquisições de dez, quinze
livros em qualquer viagem. É verdade que os livros se tornaram mais acessíveis
em nossa própria cidade e sobreveio a facilidade de que chegam via comércio
eletrônico, mas, há também, uma substituição da leitura do livro, por leituras
homeopáticas, seja do que for, em geral noticias, artigos, e, e-mails ou uma
visita ao Facebook e o recebimento de tantos boletins e ofertas eletrônicas,
que, vez por outra, são despejados sem o menor constrangimento, quando existe o
acumulo de alguns dias sem ler.
Para quem já teve uma biblioteca
com mais de cinco mil livros, os mais de quinhentos que ainda possuo hoje, já
me parecem excessivos. Informação também, por maiores que sejam as estantes, devem
ser acessíveis e, sem uma organização muito bem feita, não o são. Hoje, a moda
é utilizar o espaço nos discos rígidos, ou
CDs ou pendrives, que acumulam muito mais com muito menos esforço e mais
acessibilidade, mesmo com o risco alto de desaparecer ou, com a substituição da
tecnologia, o acesso se tornar muito difícil. Tenho muitas informações em
disquete que me parece, agora, algo da Idade Média, e que nem sei como irei
recuperar. Ainda a melhor forma de guardar informações é a mente, que,
infelizmente, com o tempo, também vai apagando certas coisas, mas, a mente é
sábia, possívelmente, esquece totalmente as coisas que devem ser esquecidas.
Esquecer, muitas vezes, é uma benção, é muito bom.
Qual o motivo, então, de minha
divagação. Bem, é que me perguntaram sobre um livro que li na adolescência de
Aluízio Azevedo e, tive que confessar que não lembrava mais do seu enredo, nem
o nome dos personagens me vieram à memória. O meu consolo foi lembrar das
palavras de Pierre Bayard que declarou “É, antes de tudo, difícil saber com
precisão se lemos ou não um livro, pois, a leitura é o lugar do
evanescente". Reli a obra e, ao
contrário da lembrança que tinha, não gostei e cheguei à conclusão também que
graças ao tempo apagamos muita coisa da memória. E que, muitas vezes, a releitura
de uma obra clássica pode ser uma experiência nova, mas, nem sempre se recupera
o prazer que nos deu no passado. Esta, por exemplo, me deu a nítida impressão
que poderia ficar no esquecimento que não me teria feito falta. Ainda assim, a
memória é tão sábia que, possivelmente, daqui a dois meses, não terei a menor
lembrança do que li hoje, mas, é claro, isto somente vale para mim. Tenho
alguns amigos que tem uma memória fantástica para coisas inúteis, ou seja, a
memória de cada um também é sabia para selecionar (e esquecer) o que nos
interessa, ou não.
Ilustração: www.sul21.com.br
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