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quinta-feira, novembro 26, 2020

DARWIN E A CONSPIRAÇÃO DO SILÊNCIO

 


Bem a velhice não é um tema muito interessante. Lembro que, jovem, recém desperto para o mundo, olhava para meu pai, na época um “velho” de 50 anos, e pensava o que ainda desejaria da vida. Mas, de fato, nesta idade, ele já se comportava como um senhor vetusto, como uma pessoa que tinha a obrigação de ser severo, de ser um farol para os seus pares e família. Talvez, por isto, apesar de meu amor por ele, e reconhecer que foi muito mais inteligente e talentoso do que sou, jamais quis ser exemplo ou farol de coisa alguma. Apesar de ser um professor, por convicção, não criei, como vejo muitos outros fazerem, discípulos. Sempre trabalhei imaginando que as pessoas devem pensar por si próprias. Quem sabe se errei muito por isto? Mas, me consolo por ver que, muitos, hoje, estão bem distantes do que desejaria, porém, pelas cabeças deles mesmo (por mais que pense que as cabeças deles são ruins!). Não quero me distanciar, porém, da questão da velhice. Ultrapassei daquela época do meu pai, em muito, na idade e, hoje, ainda olho para frente, até mesmo pensando que velho mesmo são os que possuem dez anos a mais do que eu! Embora reconheça, como o fez Simone de Beavouir que existe uma conspiração de silêncio sobre a velhice. É claro que isto é uma atitude social ocidental cristã. A questão do envelhecimento não é igual em todas as culturas. Até entre os índios há os que, por tradição, matam, por rituais, os velhos, bem como os que os conservam como guardiões da oralidade, autoridades morais e detentores do conhecimento. Entre nós, hoje, com os meios digitais, são as crianças que detém o conhecimento e riem de nós, dinossauros, ignorantes de sistemas operacionais. Mas, entre muitos índios, a morte prematura de seus anciões, como acontece hoje com o coronavírus, desorienta essas populações que ficam sem seus guias. Há, no meio científico, contudo, o embasamento a favor da velhice. Por exemplo, o neuropsicólogo russo Elkhonon Goldberg, no seu livro livro “O Paradoxo da Sabedoria (2005)” afirma que a sabedoria é uma forma de processamento mental muito avançada, de forma que somente se consegue com o tempo e que somente atinge seu auge apenas na velhice- diz ele  que justo  quando a capacidade do cérebro começa a diminuir. Este processo aparentemente contraditório é a base de sua tese que, por sinal, me parece muito correta. Para Goldberg a sabedoria dos mais velhos permite se ter a capacidade de “saber” a solução de problemas complicados ou inesperados de forma instantânea, sem esforço mental, bem com a capacidade de prever eventos que pegam as pessoas desprevenidas. Bom, aqui tenho minhas dúvidas, embora tenha visto isto em alguns velhos (mais em velhas, na verdade). Mas, me ocorreu que fizeram um escarcéu sobre a morte violenta de uma pessoa de cor no supermercado, enquanto a morte de milhares de velhos não teve muita importância. Não tive como não lembrar de Simone e de sua conspiração do silêncio acerca da velhice. Com a pandemia parece que ela foi quebrada, de vez que o que mais se ouviu foi que “O vírus só mata os idosos”. É como se dissessem que só morrem os que tem que morrer. É um sinal claro dos tempos. Numa humanidade estilhaçada pela falsa moral, pelo coitadismo e pelo politicamente correto somente merecem atenção as grandes generalizações e o que rende manchetes, como fumaça na Amazônia, racismo, a discussão inútil de autoridades sobre a vacina, tolas afirmações sobre a China ou as fofocas requentadas de Obama. A morte dos velhos, de milhões de velhos, só afeta as famílias. Só contam como mais vítimas para as estatísticas que são usadas para criticar as autoridades. Darwin, mais do que nunca, diria que nada mais natural: os mais frágeis estão mesmo destinados a desaparecer. Porém, se fosse assim, os homens não existiriam mais. 

 


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