Sem embarcar no famoso (e
inconseqüente movimento “A culpa é das Usinas”) nota-se, nos últimos tempos, um
grande desencanto com nossa capital. Em parte isto se explica porque, no
passado, havia uma interação muito rica entre as pessoas, uma diversidade
cultural e uma melhor qualidade de vida, até de vida noturna, que era palpável
e centrada numa série de locais diferentes. Hoje, seja pelo crescimento de
igrejas, pela falta de segurança e de transportes públicos confiáveis, houve
uma sensível queda dos “terceiros lugares”, locais que não são a casa nem a
empresa, como cafés, bares, livrarias, em que é possível estabelecer
relacionamentos menos formais. É uma contradição que a modernidade tenha nos
dotado do shopping, porém, nos retirou locais tradicionais de encontro e de troca
de informações. É uma ironia que o progresso, que nos faz crescer, diminua a
qualidade de vida que tínhamos, o que desperta nas pessoas mais antigas de
Porto Velho uma certa nostalgia.
Impressionante é que se afirma
que, ao contrário de Rio Branco, não temos identidade. Não sou adepto desta
tese. Penso que o que parece ser falta de identidade se identifica com o
cosmopolitismo que sempre nos caracterizou: fruto de um projeto multinacional,
a Madeira Mamoré, sempre fomos voltados para o espaço exterior, para o novo e
cultivamos um traço de tolerância e de diversidade que, no meio da selva,
sempre nos tornou pós-modernos. Sem que se planejasse, e muitas vezes, de forma
planejada, nos constituímos num laboratório de novas experiências, seja a da
borracha, da cassiterita, da corrida do ouro, da colonização ou, mais
recentemente, da energia. Projetos como planejamento participativo, zoneamento
ecológico ou Saída para o Pacífico não brotam aqui, por acaso. De uma forma ou
de outra, Porto Velho, ao longo do tempo, tem sido um imã de pessoas criativas
de todo o Brasil, e, em certos momentos, do mundo.
O estranho é que, quando nos
tornamos um centro universitário, aqui vicejam três cursos de Medicina, e
pululam muitos outros cursos universitários, a cidade parece ter se tornado
menos atrativa, pior mesmo. Um fator todos sabem que pesa: a péssima
governança. O que denominamos de Economia Criativa, as artes, a música, o
conhecimento e até mesmo o artesanato e os esportes, se encontra abandonado
pelas autoridades. É um sintoma significativo que o Teatro Estadual tenha
atravessado diversas gestões governamentais sem ser concluído. Hoje, as pessoas
de talento, de cultura, que são a fonte do desenvolvimento, cada vez mais,
exigem qualidade de vida e preferem lugares que sejam diversificados,
tolerantes e abertos a novas idéias, inclusive sob o ponto de vista do
financiamento econômico. É preciso discutir o que se pretende para Porto Velho
e que se tome medidas para que volte a ser um pólo de cultura, de criatividade
artística, cultural e tecnológica. Se as coisas continuarem como estão, o
desencanto, mediado pela violência, o trânsito horroroso, a má educação e a
falta de infraestrutura, inclusive de energia, nos deixará, efetivamente, sem
alma na medida em que as pessoas de educação elevada e de cultura, que são o
nosso principal recurso, desistam da nossa cidade cansados pela falta de
oportunidades e de apoio.
Ilustração: fotos.noticias.bol.uol.com.br
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