Há uma evidente, e
continuado, noticiário internacional que, ao analisar a Copa de Mundo de 2014
no Brasil que, no momento, dá mais atenção aos protestos da população do que ao
evento. O governo se queixa de que existe uma “contaminação” da mídia
internacional pela versão dos grandes meios de comunicação internos. Num
esforço de modificar esta imagem a presidente Dilma convidou os correspondentes
de 21 meios de comunicação que escreveram sobre o país para um jantar no qual
tentou fazer um exercício de sedução para mudar a visão dos jornalistas. O
resultado não foi lá essas coisas tanto que, nos dias seguintes, o Wall Street
Journal e o New York Times escreveram que “O clima está pesado” em relação ao
desânimo que cerca a Copa. O The Independent postou que “Motins, greves e
engarrafamentos encobrem a abertura em São Paulo”. O Financial Times e o
francês Libération que classificaram a greve dos metroviários em São Paulo como
“um movimento de cólera geral” e, completando as citações o chileno El Mercurio
comenta “O país está blindado como se tratasse de uma guerra”. E com o
xingamento do qual Dilma foi alvo na abertura da Copa a visão, certamente, não
deve se alterar muito. A tendência é de que a imagem se torne ainda mais
negativa.
Pelo lado do governo, e
do comando da campanha de reeleição, vigora a versão simplista de que a mídia estrangeira se pauta pelo noticiário dos grandes
grupos de imprensa brasileiros, que estariam, em diferentes níveis,
comprometidos com as oposições na próxima eleição presidencial. Há um
imenso problema nesta versão que é a de
que tanto os correspondentes estrangeiros, quanto o público não teriam
capacidade crítica, comprando a visão partidarizada da imprensa, que seria a
gênese do mau humor coletivo e das
dificuldades de imagem do governo. É como se o PT não tivesse obtido hegemonia,
não tivesse um largo aparelhamento na imprensa, e sendo o seu maior cliente,
considerasse que a imprensa faz o relato que deseja e os fatos, em si, nada
significassem, ou seja, as pessoas não analisam, nem tem outros meios de ter
opinião e dependem de como os fatos são narrados e dos interesses (oposicionistas,
no caso) de quem faz a narrativa.
Embora a narrativa
importe, a percepção dos fatos é muito mais decisiva que as narrativas. Se não
o fosse, com a mais impressionante máquina de propaganda que um governo já
possuiu no Brasil, com a superexposição que Lula e Dilma possuem, com os gastos
milionários de empresas estatais em propaganda positiva, certamente, a imagem
do governo devia ser uma maravilha. Não é. Contra a versão das “Polianas”
petistas de que o Brasil vive uma fase cor de rosa, com boa parte da cor
produzida pela propaganda governamental intensa, os cidadãos topam com o lixo,
a poluição sonora e visual, com ruas e estradas esburacadas, transporte público
e serviços públicos em geral ruins e, para completar, a insegurança pública na
vida e no trânsito, que ceifam 100 mil vidas por ano e colocam o Brasil como um
dos países de maior número de homicídios no mundo. A construção dos estádios e
as promessas não cumpridas de mobilidade urbana foram só a gota d’água na
insatisfação pública que se testemunha e se propaga no que continua a ser o
mais eficiente meio de comunicação: o boca a boca.
Principalmente com a
internet a grande mídia perdeu muito de sua capacidade de alimentação do
imaginário coletivo. A tese do Planalto do povo sendo alvo de uma lavagem
cerebral, para construir uma narrativa única, peca por falta de verdade e
historicidade. Fosse assim o PT não estaria no poder. Que a imprensa tem seu
lado e seus erros, é verdade. Mas, não tem nem uma versão única, nem deixa de
ter uma quantidade significativa de órgãos, alguns muito bem pagos, para
difundir a versão cor de rosa do governo, porém, assim como os jornalistas
estrangeiros, a população se comporta em relação ao que estão vendo e sentindo.
Agora tentar dizer que não há uma grande
insatisfação da população e que é somente os “VIPs”, a elite branca “raivosa” xingou
Dilma no Itaquerão é buscar distorcer o fato de que, em muitos momentos, das
vezes em que ocorreu, o xingamento
partiu das arquibancadas, onde estava a população mais pobre, e que o coro não
era nenhuma novidade, pois, se iniciou muito antes num show do Rappa, que não
se pode dizer que concentra a elite, quando, pelo menos, 35 mil pessoas
entoaram o xingamento em relação à presidente. Se há uma narrativa para ser
revista é a de que os correspondentes estrangeiros não são profissionais experientes
e não procuram externar, com um olhar externo, o que veem e o que veem é uma polarização
exacerbada entre um governo triunfalista, que pinta uma versão de um Brasil de
primeiro mundo, que ninguém enxerga fora eles, procurando, de qualquer forma,
desqualificar ou criminalizar quem aponta erros ou crítica uma Copa planejada,
e mal, para fins políticos. O xingamento de Dilma é só o início de uma fantasia
que está sendo rasgada pela realidade dos fatos.
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