De repente, deve ser
culpa dos tempos, me vejo refletindo sobre a felicidade. É preciso acentuar que
sempre alimentei a ideia, ligada ao pensamento do inglês Bertrand Russell, do livro
“A Conquista da Felicidade”, de ser necessário, para tentar ser feliz,
alimentar uma multiplicidade de interesses e de relações com as coisas e com os
outros homens. Para ele, em síntese, a felicidade seria a eliminação do
egocentrismo. Neste sentido, o que não deixa de ser verdade, é impossível ser
feliz numa sociedade infeliz. Não muito diferente do pensamento, por exemplo,
de Freud que, num estudo que tem menos de psíquico do que de filosófico,
conclui em “O Mal Estar da Civilização” que, face às exigências impostas pela
civilização, a felicidade é uma meta irrealizável.
É evidente que a ideia
de felicidade é indissociável da ideia de prazer. Aliás, prazer e desprazer são
conceitos fundamentais para se entender a concepção de felicidade. No terreno
filosófico sobre o qual Freud edificou o conceito de prazer sua leitura é de
uma crueza e precisão impressionante. Só rememorando: acentuava que o princípio
de prazer é um modo de organização que, governando o psiquismo do início da
vida, baseia-se na busca de prazer, mas, também em evitar o sofrimento. Freud é
cético e clínico a respeito:
[...] o programa está
em desacordo com o mundo inteiro, tanto com o macrocosmo quanto com o
microcosmo. É absolutamente irrealizável, as disposições do todo – sem exceção
– o contrariam. Diria-se que o propósito que o homem seja “feliz” não está
contido no plano da “Criação”..
Para ele, portanto, se
fazia necessária à introdução do princípio de realidade. Manter uma condição
subjetiva de prazer sem desprazer é uma meta inalcançável. O mundo externo não
nos permite a satisfação irrestrita, fora as questões psíquicas, como o tempo
curto do prazer, a necessidade do contraste, ou seja, como ter prazer sem desprazer?
Freud, é, para não ser pornográfico, um torturador mental de alto estilo, ao
ressaltar que, sob o ponto de vista psíquico, há uma outra explicação para o
fato do princípio de prazer ser irrealizável: a idéia segundo a qual a
felicidade está relacionada ao estado zero de tensão, ou seja, à morte, sendo,
nesse caso, incompatível com a vida, por conta da própria constituição do
psiquismo. E, com a frieza de um estatístico, Freud nos afirma que as possibilidades
de sentir infelicidade são muito maiores. A infelicidade provém do corpo, do
mundo externo e dos relacionamentos humanos. Neste sentido, parece que ao
seguir Russel e o grande neurocientista português, António Damásio, tenho
navegado contra a corrente. Se for levar em conta Freud melhor é ter menos,
inclusive relacionamentos, notícias, informações e até mesmo desejo de
felicidade. Subjacente ao que diz, os homens que reduzem suas reivindicações de
felicidade vivem melhor e são mais felizes somente por terem escapado ao
sofrimento. O que me parece, apesar de como filósofo me encontrar num estágio
mais rasteiro do que peito de cobra, é que, nem sempre o que se pensa,
corresponde aos desejos, à capacidade psíquica e do corpo. Muitas vezes, abrir
mão de algo é muito doloroso. Sendo assim como diminuir as reivindicações? Freud
que me perdoe, mas, vou ouvir música. É muito desprazer ver que nos fornece uma
análise pessimista, dura e implacável: a promessa de felicidade é uma miragem da
sociedade moderna e, sob o ponto de vista filosófico, está destinada a
permanecer nada mais do que uma promessa. Felicidade foi embora!
Ilustração: http://divagacoesligeiras.blogs.sapo.pt/.
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