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domingo, janeiro 23, 2011

O poder escancarado e sem máscaras faz o que quer


A volta dos que nunca se foram
Leio comentários de analistas, e até mesmo de pessoas comuns, criticando que, depois de passada a eleição presidencial, com a vitória de Dilma Rousseff, se anuncia a volta de membros do Partido dos Trabalhadores que, a bem da verdade, nunca foram deixados de lado. Somente esperavam a oportunidade para reaparecer. Assim, não me parece nem novidade nem espantoso, que alguns dos caciques petistas, por conveniência defenestrados do poder por conta do envolvimento em episódios de corrupção, estejam de volta. É claro que os casos mais clamorosos são o do ex-deputado e ex-chefe da Casa Civil José Dirceu, e de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do partido, que estiveram envolvidos até o pescoço no chamado “escândalo do mensalão”, porém, há muitos mais que, passada a tempestade estão por aí gozando as benesses do poder.
Devo dizer que não sei mesmo qual o espanto. As indicações da “reabilitação” de petistas são históricas e notórias e começaram com o próprio Lula da Silva que jamais colocou em xeque seus aliados que, ao contrário dos outros, que cometem crimes, só cometem “erros” ou possuem “despesas não contabilizadas”. Efetivamente, por exemplo, José Dirceu, jamais esteve ausente das hostes petistas manobrando, apesar de ter oficialmente perdido seus direitos políticos, nos bastidores com uma desenvoltura não menor do que seu antagonista e detonador do “mensalão”, o presidente informal do PTB, Roberto Jefferson. Sabe-se que Zé Dirceu não apenas costurou acordos como foi vital para impor certas situações políticas, como nos bastidores se diz a respeito de Minas Gerais e do Ceará. Suas viagens pelo país, em jatinhos, por menos noticiadas que tenham sido, geraram fatos e demonstram que sua atividade política tem sido permanente. Ou seja, mesmo sem cargos, mesmo desprovido do mandato político, manteve-se sempre muito próximo do centro do poder neste tempo todo de domínio petista. Delúbio, é verdade, o mais estigmatizado, manteve obsequioso silêncio e, nas raras vezes, em que quis colocar a cabeça de fora foi advertido. Com razão na medida em que tesoureiro sem utilidade só atrapalha.
Embora estejamos nos tempos do Ficha Limpa, que foi defendido por interesses notórios do PT que visavam ganhar, como ganharam, o governo do Distrito Federal, ficha suja não existe no partido até porque, como disse explicitamente o líder do governo na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (PT-SP), “nenhuma pena é eterna”. Porém, o perdão dos companheiros, que se ensaiava, se tornou impossível de não ser dado depois que, na posse, uma serelepe ex-ministra Chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, apareceu perdoada por um inquérito interno do governo. Assim, com tanta bondade no ar, qual a surpresa que, no ano em que o escândalo do “mensalão” deve começar a ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a estratégia petista reabilite os que nunca se foram para desqualificar a dimensão dada ao caso e vender a versão de Lula de que tudo não passou de uma ficção para depô-lo do cargo? É só a continuidade da tarefa anunciada por Lula, em cujo governo vicejaram esta e outras denúncias de corrupção, da empreitada de desmistificar a existência do “mensalão”. Que providência mais efetiva para isto que reabilitar os inocentes companheiros? E, como Palocci já foi inocentado, e Genoíno convidado para ser assessor do Ministério de Defesa, que melhor ataque pode existir que resgatar a imagem de notórias personagens políticas atoladas em passado recente num lodaçal de denúncias.
Não importa que o procurador-geral da República, Antônio Fernando Souza, tenha apontado a existência de uma verdadeira organização criminosa envolvendo políticos, empresários, publicitários e doleiros num grande esquema de compra de apoio político. Nem que a estimativa do procurador seja de que a quadrilha girou em torno de R$ 55 milhões (aliás, uma imensa subestimação) e tenha imputado aos envolvidos os crimes de corrupção ativa, passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, peculato e falsidade ideológica. Para o projeto de poder petista a inocência deles é perene e justificada. Sem eles não haveria a tomada de poder. Por esta razão, de fato, não se trata de uma volta. Eles nunca foram.

quarta-feira, janeiro 19, 2011

A Tragédia real


A tragédia de sermos o país do futuro

Silvio Persivo

Tragédias são coisas lamentáveis. Tragédias brasileiras são, a meu ver, coisas cotidianas na medida em que vivemos a tragédia permanente da mais completa falta de educação. É o que constato em relação a tragédia da região serrana do Rio de Janeiro e da afirmação, no mínimo, risível de que, finalmente, irá se implantar um sistema moderno de prevenção de tragédias como esta última. Não quero parecer indiferente, nem tampouco crítico ou profeta de coisas acontecidas, mas, quem não sabe que a situação é a mesma em vários pontos do país na qual a miséria ou apenas o poder desrespeitando as leis se estabelece em áreas que não poderiam ser ocupadas? Já tive, em tempos passados, a função de implantar planos urbanos e, bem sei, como são desrespeitados e até mesmo destruídos pelas forças econômicas e políticas que não vêem senão os interesses imediatos.
Nem sabor de novidade, exceto na sua extensão, a tragédia tem, pois, Angra dos Reis, passou por um processo similar na passagem de 2009 para 2010, quando o Rio de Janeiro foi sacudido por uma tragédia igual de proporções menores. O que aconteceu? Lembro que logo depois começaram a bater os tambores e os tamborins anunciando o carnaval e o Brasil caiu no samba esquecido e curado, as providências adiadas como sempre, e tudo ficou como antes soterrado pelos ecos da folia. Este ano o carnaval será mais tarde e a tragédia foi maior, porém, quem duvida que o esquecimento será o mesmo? Não tenho a menor dúvida de que tragédia que, hoje, ocupa longas horas dos noticiários será relegada a segundo plano para dar passagem à alegoria carnavalesca e, depois dela, ao futebol, de forma que na folia e na bola continuaremos a esperar que as tragédias anunciadas não retornem, embora, os lúcidos, normalmente, ébrios, saibam que um país que desgraça sua juventude com a inércia e a falta de estudos não tem futuro.
Não, meus amigos, não pensem que estou amargo neste começo de ano. Estou bem comigo mesmo. Talvez nunca estive tão consciente da minha pequenez e de que sou uma pobre e teimosa voz a desejar que o Brasil dê certo, como disse Caetano Veloso, porque eu quero. O fato, porém, é que brigo, discuto, contrário meus próprios interesses para ser fiel a princípios e vejo que é uma luta vã. A tragédia real não é a da natureza que sempre causará problemas, mas, sim a triste, amarga e molhada, não da chuva, mas, das lágrimas que a ignorância coletiva cultua de não construirmos um amanhã melhor pela educação, que é mera palavra para discursos políticos. Não serão as bolsas misérias, nem as ajudas festeiras de última hora que darão dignidade aos brasileiros. Cidadania só existe como afirmação pessoal, como oposição ao outro, por isto não se outorga, não se dá. É preciso que se conquiste. A tragédia brasileira real é de esperarmos a libertação como uma dádiva. Não é. O Brasil sem tragédias só existirá quando houver educação e representatividade política. Enquanto isto não existir seremos o eterno país do futuro.

domingo, janeiro 02, 2011

O verdadeiro tamanho do desafio



É bem verdade que, no Brasil, as coisas só começam de fato depois do carnaval. No entanto, a posse de Dilma significa, na prática, o apito inicial do jogo. O recado das urnas foi o mais claro possível: as forças produtivas, as forças modernas do país, estão descontentes e exigem mudança. É verdade que, aliado ao coronelismo, o clientelismo oficial ganhou a eleição e um prazo de continuidade, porém, a um preço muito elevado, que o novo ministério, uma eclética junção de interesses contrastantes, obriga a ter uma dose muito grande de força para que alguma coisa ande, mas, se não andar o bicho pega.
A realidade de nosso país foi obscurecida pela enceradeira de Lula da Silva. Dando brilho ao piso ruim foi empurrando com a barriga, adiando as decisões necessárias e chegamos onde estamos: grande parte da população feliz de estar endividada, uma invasão de produtos chineses que desindustrializa o país e voltamos a ser agrário-exportadores, ao mundo pré-Juscelino até no toque pai dos pobres do governo passado. A propaganda oficial pode fazer tudo: pintar a vida de cor de rosa, eleger Dilma, tornar Lula um estadista, esconder a realidade da saúde, da educação e da infraestrutura aos pedaços, todavia, não tem como sustentar a situação econômica de um país que vem perdendo produção, empregos de qualidade e, especialmente, agregação de valor aos produtos e competitividade. A transferência de renda depende dos setores econômicos que produzem, porém, estes estão estafados de carga tributária elevada, de burocracia, de crédito caro e de sustentar uma ciranda de juros exorbitantes que somente serve aos banqueiros e aos rentistas.
È claro que o Brasil não vai piorar embora possa. Deve por um tempo continuar no mesmo ramerame. A questão é que o modelo que sustentou o PT, que é mais eleitoral e de propaganda que de crescimento real, está chegando aos seus limites e, na hora, em que o sempre bafejado Lula, o prestigiador das palavras, cai fora. A fórmula parece querer ser aplicar o mesmo modelo. Depois da gastança na farra eleitoral, o arrocho de mais dois anos e a volta da farra com um crescimento recorde para “mostrar” que tudo mudou. Nada mudou porque as bases são as mesmas. Lula com seu PACs e sua retórica de crescimento, apesar de ter pego céu de brigadeiro, durante todo o seu vôo, conseguiu, na média, 3,5% de crescimento contra 2,5% de Fernando Henrique, pegando crises e arrumando a casa, e conclui seu mandato com um produto e participação menor em relação ao resto do mundo. Ou seja, o país continuou seu voo de galinha e diminuiu de peso, embora, tenha a seu favor ter ligeiramente melhorado as condições de vida da base da pirâmide. A questão continua a ser que, o que sustenta a economia, é a produção e a produção competitiva. Para isto precisamos de educação, carga tributária compatível com o grau de desenvolvimento, governo eficiente, desburocratização e poupança interna. È uma agenda, sob o ponto de vista técnico, de todos conhecida. Terá Dilma Roussef capacidade de enfrentar os desafios que Lula não enfrentou? Este é o tamanho do desafio da criatura.