Total de visualizações de página

terça-feira, outubro 13, 2015

Com prêmios, mas, sem receitas


O professor escocês Angus Deaton foi premiado com o Nobel de Economia. Não discuto seu merecimento ao prêmio, nem seu trabalho. Qualquer economista ou intelectual que se dedique, como foi o seu caso, a desenvolver um trabalho no qual procura diminuir a pobreza partindo do ponto de vista de que, segundo o comitê responsável pela escolha, "Para elaborar políticas econômicas que promovam o bem-estar e reduzam a pobreza, devemos primeiro perceber as escolhas de consumo individuais” é digno de elogios e prêmios. É um pensamento que busca encontrar os mecanismos entre o agir individual e o comportamento macroeconômico, o que revela a visão de um pensador.
O que me incomoda, como já incomodou no ano passado quando o prêmio também contemplou uma visão macroeconômica da regulação, é o fato de que a contribuição do agraciado foi de construir modelos abstratos que buscam captar as escolhas das pessoas e empregar métodos estatísticos apropriados em suas estimações. Dizem que, com seus trabalhos, se avançou muito na estimação de um sistema de demanda por bens e serviços.
Sinceramente, sou, como economista, ainda um grande cético dos modelos econométricos que, embora pense que podem ajudar na economia, jamais surgirão de suas abstrações os reais entendimentos dos mecanismos econômicos. Afinal, para se estimar um sistema de demanda, se precisa de uma teoria. É necessário, antes de mais nada, um modelo da escolha do consumidor, ou seja, uma representação abstrata das preferências das pessoas que gera, como resultado, suas escolhas de consumo.  Aí, para mim, está o busílis da questão. Como se ter um modelo correto? É um problema complicado. Porém, isto não parece abalar os que utilizam uma combinação de modelos, métodos estatísticos e dados sobre indivíduos e/ou firmas, a norma na pesquisa em economia, que, supostamente, acaba, segundo eles, por trazer resultados relevantes. Continuo a pensar que um modelo, macroeconômico ou microeconômico, se constitui num conjunto de equações que tenta representar a economia como um todo, mas, me parece que, quanto mais complicados ficam os modelos, são, ainda assim, uma representação muito simplificada da economia real. Não tiro os méritos de muitos estudos deste tipo, porém, sou cético sobre o avanço do entendimento econômico passar pelo uso cada vez mais intensivo de modelos matemáticos e computadores. E, sinceramente, me parece impossível que, por exemplo, o estudo que elaborou nos anos 80, com seu colega John Muellbauer, de um conceito de “Sistema Quase Ideal de Demanda” (AIDS, na sigla em inglês), que estudava o comportamento dos consumidores seja muito mais do que um exercício intelectual que, dificilmente, terá algum uso prático. Por isto considero muito mais importante o pensamento de Deaton e seus trabalhos para medir pobreza e desigualdade.

Não sei o que as pessoas pensam, mas, como economista me incomoda muito que, o que aparece como evolução na Economia, não deixe de ser, aos olhos leigos, tremendamente banal. É verdade que, às vezes, explicar as coisas mais simples, cientificamente, é complicado, mas, nos casos recentes do Nobel de Economia, estimar demandas na economia e/ou a necessidade de regulação do mercado não parece ser um avanço significativo, principalmente, quando se culpa os economistas por tantas coisas no mundo que não funcionam. Ainda mais quando se espera que, como médicos, os economistas tenham as receitas para aplacar as dores do mundo. 

sexta-feira, outubro 09, 2015

Será que vamos continuar estocando vento?


O Brasil é um país de técnicos. De botequim, sem nenhuma formação, naturalmente. Aqui, talvez, seja muito simbólica a história das instruções que, contam, Vicente Feola, técnico do Brasil na Copa de 58, na Suécia, teria dado para Garrincha. Segundo o folclore ele teria dito que ganhar o jogo era fácil. Bastava passar a bola para Garrincha que driblaria dois zagueiros russos e passaria a bola para alguém fazer o gol. E Garrincha, a quem cabia as dificuldades da tarefa, perguntou, com sua ingenuidade natural, se o técnico havia combinado com os russos....
No Brasil, infelizmente, a política (e o governo também) se comporta de forma similar. Querem passar a dificuldade para o outro. Driblar a realidade com o discurso. No país as decisões e as prioridades parecem sempre fugir do real, parecem sempre desejar driblar o possível, o desejável, a maneira simples e direta de tratar dos problemas. É um país onde, apesar de ter conhecimento em muitas áreas, ainda se faz política pública defendendo que é possível crescer, desenvolver sem educação e sem investimento, via crédito e aumento de consumo. Onde se está sempre a pregar uma fórmula mágica como a de que é possível incluir a população pobre, retirá-la da pobreza sem criar crescimento, sem aumentar a produção, sem gerar novos empregos, com bolsas que incentivam as pessoas a não trabalhar. É como acreditar que se pode erguer um prédio sem alicerces. E o incrível é que, mesmo com o prédio tendo caído, ainda aparece um documento de “intelectuais” dizendo que a culpa é do engenheiro que chegou para retirar o entulho e tentar reconstruir o que sobra....
É um país que tem um histórico de escolhas, de prioridades erradas. Basta ver que, com dimensões continentais, optou pelo modal rodoviário. Que com sol, vento e água em abundância, compartilha com a África, a glória de não ter aproveitado todas as oportunidades de seus recursos hídricos, bem como permanece num terrível atraso em relação ao uso da energia solar e eólica. Mas, é, em especial, nas políticas públicas que esta tendência se manifesta da forma mais negativa e cruel. Escolhemos um governo que se arrasta já pelo quarto mandato que insiste em tentar aumentar o controle do estado quando, é, mundialmente comprovado, que o desenvolvimento se faz com um bom ambiente econômico, com um mercado de regras claras e regulado e não por meio de intervenção estatal,  mais burocracia e leis que, claramente, só favorecem a corrupção.
Não é o governo que produz. Governo toma dinheiro das pessoas que produzem e é mais nocivo, quanto mais, como agora, além de tomar não devolve em infraestrutura, segurança e serviços o que se espera dele. Quem produz são as empresas e as pessoas. Neste sentido quanto mais elas tem uma carga tributária menor e mais condições de empreender, mais o país tem condições de progredir. Neste sentido, é meritória a iniciativa do Sebrae para transformar o Dia da Micro e Pequena Empresa em uma data de mobilização da sociedade para consumir produtos e serviços de pequenos negócios, com o Movimento Compre do Pequeno Negócio. Mas, publicidade somente não basta. O governo que louva o pequeno negócio em discursos e publicidade é o mesmo que acabou de enterrar o Ministério da Micro e Pequena Empresa, mas, não apenas isto. Como se não bastasse a carga tributária, a burocracia, o aumento da energia e dos combustíveis, propõe, sem a menor vergonha, um imposto como a CPMF. Em suma, faz o discurso de que todos temos talento para corredores em público, mas, nos bastidores, prepara todo o arsenal para nos cortar as pernas. E ainda quer nos convencer que o faz em nome de nosso bem estar e futuro. Até quando vamos continuar estocando ventos e acreditando que as palavras podem mudar de significado de acordo com o governante de plantão? Não sei, mas, o Brasil, se não mudar, e rápido, caminha, celeremente, para o atraso.


Ilustração: nogueiramarques.com.br

domingo, outubro 04, 2015

Desabafozinho de hoje


Sempre gostei da vida. Gostava muito da vida em Porto Velho. E Porto Velho já foi uma cidade pacata, uma cidade onde a vida se arrastava e o trânsito fluía e, é verdade, sempre foi quente e empoeirada. Porém, era um calor diferente, um calor calorento, mas, amável. Era um calor, digamos divino. O calor atual não é de deus. Não dá para viver e aceitar. Não é um calor digno, é um calor sem humanidade. E este parece ser o tom da vida ultimamente. Tudo parece farsa, tudo parece sem sentido, as coisas parecem não se encaixar por mais que nos esforcemos, por mais que busquemos saídas, parece que entramos num labirinto onde o próximo túnel parece ter um desafio maior, como se as pecinhas da vida tivessem se desenfileirado, que as engrenagens estejam rodando ao contrário. Sinto que está tudo muito estranho, que as pessoas não estão bem com a vida, que estão achando tudo tão ruim, tão esquisito e triste, que, de repente, me pego pensando no passado, voltando ao passado, a troco de nada, só para me sentir bem, lembrar que houve um tempo em que tudo era melhor.
Claro que me sinto mais velho, e os anos contribuem para ter uma perspectiva pior, que continuo sem dinheiro (isto, porém, é a novela de uma vida inteira da maior parte dos brasileiros), engordei, perdi cabelos, perdi pessoas queridas, amei e deixei de amar, me afastei de quem não devia me afastar, fui bom com quem não devia ser ou ruim com quem devia amar, enfim, cometi as tolices que todos nós fazemos, de vez que sou, igual a todo mundo, uma besta que toma decisões sem pensar muito e depois não tem mais como chorar o leite derramado. Mas, a questão, embora seja comigo também, não é só comigo. Nós estamos precisando de alguma coisa que mude a nossa perspectiva e, me parece, muito esquisito que tudo esteja tão mau. E ainda mais com tanta dor, suor e calor. E ainda é mais esquisito por ser primavera, uma época de renascer, recomeçar, das florzinhas de ipê florindo, dos passarinhos nos galhinhos no sol. Mas, não tem jeito. A vida não está se encaixando direitinho e no noticiário só sei de roubos, de políticos mafiosos, de assalto aos cofres públicos e crimes. E tenho uma saudade danada de um dia mais claro, um céu mais azul, bem azul, daqueles que cantam na marcha (Azul, nosso céu é mais azul)  que virou nosso hino. E penso otimista: amanhã será outro dia.

Tusso gripado e não posso deixar de assinalar:-É, mas, hoje tá horrível.