Total de visualizações de página

segunda-feira, maio 18, 2015

O presente chinês será grego?


As manchetes já festejaram e o governo brasileiro vê quase como uma tábua de salvação a vinda do primeiro-ministro da China, Li Keqiang, com mais de 200 empresários e um pacote de investimentos destinados ao Brasil estimados em 53 bilhões de dólares, que tornaria realidade alguns grandes projetos brasileiros necessitados de capital, como é o caso da Ferrovia Transoceânica, um megaprojeto de ligação ferroviária entre o Rio de Janeiro e os portos do Peru, investimentos em energia, como a linha de transmissão da usina de Belo Monte e projetos industriais, com ênfase no setor automobilístico e de máquinas e equipamentos. Bem, a própria denominação “negócios da China” já traz em si, a ideia de lucros extraordinários. A questão, quando se trata com os chineses, é de perguntar: extraordinários para quem?
Uma das características intrínsecas ao modo de atuar dos chineses, na atualidade, é a de que eles têm sido extremamente competentes na estratégia de oferecer grandes projetos de infraestrutura para outros países que, efetivamente, criam grandes oportunidades para seus investimentos, criam mercados para sua mão-de-obra e exportações, abrem maiores concessões em relação aos seus interesses e passam a exercer maior influência sobre os países que aceitam suas propostas. Não se precisa ir longe para buscar exemplos, pois, aqui do lado, temos o caso argentino que, em troca de financiamento, permitiu que a indústria chinesa inundasse o mercado argentino com centenas de trens de passageiros, vagões de carga e locomotivas, além de outros tipos de materiais, enterrando o pouco que restava da indústria local e, como dano colateral, atingindo também a indústria brasileira que seria um potencial fornecedor de componentes e equipamentos para o setor ferroviário argentino.

Assim, por mais que seja evidente a nossa necessidade de atração de investimentos e de melhoria da logística, a pergunta que não pode deixar de ser feita é: a qual custo? Se, como tudo indica e os chineses são hábeis em pedir, for com a flexibilização das regras de conteúdo nacional para a aquisição de equipamentos, será que vale a pena? Se ampliado o espaço para a participação de investidores estrangeiros nas novas concessões para projetos de infraestrutura, como os brasileiros terão condições de competir contra um investidor chinês em posição privilegiada, sendo, como é,  competitivo na tecnologia, nos equipamentos e com a prerrogativa de contar com o financiamento? É preciso lembrar que, por lá, eles exigem participação dos chineses em qualquer tipo de investimento. Será que, por aqui, haverá, para os brasileiros, alguma contrapartida positiva a estes investimentos chineses? Ou, vamos perder a oportunidade de ter competitividade logística na esteira da construção de uma infraestrutura melhor? Ou, em nome do imediatismo, jogar a pá de cal na já maltratada indústria brasileira? A resposta será dada pelo governo se aceitar, ou não, a “flexibilização das regras de conteúdo nacional” e uma maior “abertura de mercado para exportações chinesas”. É preciso acentuar, parodiando o passado, que nem tudo que é bom para a China é bom para o Brasil.  

Ilustração: img.photobuckey.com 

quarta-feira, maio 13, 2015

A crise é, acima de tudo, política


Quem mora em Rondônia sente os sinais da crise seja no seu comércio, seja na maior dificuldade de arranjar trabalho ou até mesmo na venda de serviços, ainda que temporários. Principalmente os micros e pequenos são os que mais se queixam com a sensível queda da demanda de bens e serviços. A questão não é apenas rondoniense. É um problema nacional. E não se pode nem dizer que não tenha sido anunciada, denunciada e que faltassem avisos. A questão foi que, em especial, no ano passado, com o período eleitoral, o governo se negava a ver os sinais da crise e tomar as providências necessárias e amargas que, agora, vem pretendendo tomar.
Economistas, e estudiosos de desenvolvimento, porém, sabiam, e sabem, que desenvolvimento não é um problema quantitativo, nem de aumento da demanda. Porém, o governo sempre se negou a reconhecer, mesmo quando os adota,  os indiscutíveis méritos do passado, em especial de Itamar Franco e FHC, que controlaram a inflação e permitiram que o país tivesse segurança econômica e previsibilidade. Lula, não teria tido as condições que teve para governar, razoavelmente bem, se não fosse o fato da inflação ter sido controlada, o déficit público administrado e tivessem lhe dado um país com condições de crescer. Mérito seu foi o de manter a política econômica herdada introduzindo mudanças microeconômicas e estimulando a demanda via crédito. O que fez com que houvesse uma grande sensação de melhoria, para a população brasileira, no seu governo foi o crescimento do crédito que, historicamente, sempre foi de 24% e subiu para 48% no final. O crédito, e ainda mais de longo prazo, a melhoria introduzida pela ampliação da bolsa família aliado a aumentos salariais acima da inflação, por algum tempo, criaram a sensação errada de ser possível desenvolvimento sem aumento de empreendedorismo, dos investimentos e da educação. Criou-se a jaboticada brasileira de crescimento via demanda, o que nenhum economista que se preze consegue conceber como nem sequer razoável. Acrescente-se a isto, os erros de política econômica, que não foram poucos, e a crise seria inevitável, de vez que é a cobrança da demanda excessiva, sem base no incremento da produção, uma hora teria que acontecer.

A grande verdade é que a crise tem sua raiz na ideologia de que é possível criar crescimento via o estado e que o estado tudo pode. Esta ideia errada, que levou o governo a manter políticas irreais dos preços da energia e dos combustíveis, além da intervenção desastrada das desonerações, para manter uma situação insustentável, agravaram os problemas das contas públicas e desembocaram nos aumentos da inflação e do dólar. Não há, agora, como esconder que tivemos, nos últimos tempos, uma sensível queda dos investimentos e do Produto Interno Bruto-PIB, por erros de condução da política econômica, nem existem formulas mágicas para sair da crise. O governo, no entanto, continua a não fazer o seu dever de casa quando não diminui a máquina administrativa, não melhora os gastos públicos e é incapaz de conseguir a confiança pública para criar um programa capaz de retomar o desenvolvimento. Por tal razão estamos num momento difícil onde a insatisfação é geral por se cobrar uma conta que, para a grande maioria da população, é indevida e contraria suas expectativas de uma vida melhor. Infelizmente, a crise está aí, e ainda teremos que conviver muito tempo com ela, se não houver um consenso sobre os rumos que o país deve tomar. Sob o ponto de vista econômico há até um consenso sobre as medidas que devem ser tomadas, porém, a economia é, acima de tudo, política e não se avança quando não se tem quem aponte os caminhos e tenha credibilidade para negociar os impasses. Os ajustes propostos pelo ministro Levy tem seus méritos, mas, não bastam para mudar o quadro de estagnação econômica em que estamos e, pelo jeito, sem mudanças políticas, ainda teremos dificuldade para sair do ponto morto por muito tempo. A crise, embora econômica, revela o que as ruas têm denunciado: falta representatividade e capacidade política para atender as demandas públicas que a população exige. Em suma: a crise, apesar de econômica, é, acima de tudo, profundamente política. 

Ilustração: www.jj.com.br

terça-feira, maio 05, 2015

Nem tudo é tão relativo


Não deixa de ser folclórico que, muitas das pessoas que se dizem de esquerda, fiquem babando e rejubilando-se pelo fato de terem divulgado que Vaccari, o tesoureiro petista, possui um patrimônio pequeno, como se isto fosse uma prova de honestidade. Convenhamos que, como em outros casos, é muito provável que os bens e valores adquiridos estejam em nome de outras pessoas ou até mesmo em contas no exterior. Afinal, devemos lembrar que, não é por acaso que a justiça o acusa: inúmeros os delatores que citam sua participação e/ou recebimento de parte das propinas da Petrobras.
Aliás, não é de meu feitio, nem me cabe ficar discutindo culpas. Continuo a dizer que, para mim, a culpa real é a de quem comanda seja a família, a casa, a empresa ou o país. E, neste sentido, é preciso lembrar que o principal acusado de tudo se diz um homem honesto, acima de todas as suspeitas, pelo menos, 90% melhor que todos os jornalistas das principais revistas do país “enfiados uns nos outros”. É claro que tal inocência somente pode ser entendida à luz da ideologia. Como se sabe, no passado, homens como Lenin, Stalin ou Trotsky, utilizaram a versão de que ao revolucionário, ou seja, para quem se diz de esquerda, a mentira, a distorção e até mesmo o assassinato possuem uma conotação diferente, qual seja a de que, como é feito em nome do futuro, do socialismo que, naturalmente, viria, tudo seria válido. Assim, por uma dicotomia bastante conveniente, para uma nova elite, há uma ética para os que atuam em nome do povo e a ética dos burgueses. Assim, quem rouba para o partido e para o suposto futuro, é inocente, por ajudar o curso da história e por construir a utopia socialista. De forma que se, qualquer um de direita, roubar por qualquer motivo será um ladrão mesmo, mas, quem rouba em favor da gloriosa revolução se preso, será, sem dúvida, um preso político. Ou seja, na cabeça de muitos os ideologizados valores como honestidade, respeito aos direitos do próximo, à vida, à liberdade etc., somente se justificariam em função dos propósitos revolucionários. De forma que tudo é relativo e a ética e a política se transformaram em valores instrumentais.
Seria de se esperar que tal relativismo ficasse no passado com a queda do Muro de Berlim e o fim melancólico do socialismo real que deixou suas viúvas inconsoláveis. Mas, não, apesar da evidência histórica, muitos persistem em viver a velha dicotomia entre esquerda e direita e, sob o pretexto de serem os defensores dos pobres, avançam sobre a riqueza de todos brandindo o velho pragmatismo revolucionário. E, mesmo quando se transformaram na elite, e usam (e abusam) do poder durante mais de uma década, se sentem e pregam serem os mais inocentes dos homens por tomar o que não é seu, desde que seja em favor do partido e da revolução, mas, sem abrir mão dos privilégios e das benesses (e muitas vezes alargando-os) que tanto criticavam na velha elite, a quem costumam atribuir tudo que é de ruim inclusive seus próprios erros. É fruto desta distorção mental e do desdobramento de uma lógica infeliz que qualquer um que não concorda com suas teses é perseguido e vira inimigo. Os monopolistas da verdade, e do bem comum, usam o poder que tomaram, graças às liberdades democráticas, para solapá-las e não medem os meios para facilitar a instauração de uma “ditadura do proletariado”, inclusive usando recursos públicos e tentando manietar a imprensa por meio de dinheiro ou até mesmo de supressão das vozes discordantes. O problema é que, num país complexo como o Brasil, é preciso, pelo menos, ter uma gestão eficiente da economia e, neste sentido, o velho hábito socialista de viver somente do trabalho alheio parece que se esgotou. Não é a política quem está enterrando as velhas ideias, mas, sim a economia. O governo vive da iniciativa privada e não pode, como tem sido feito sistematicamente, apenas sugar das classes produtivas sem afetar, drasticamente, os níveis de bem-estar e de crescimento econômico. O fim do ciclo do PT não será alcançado via política e sim pela economia. Pelo fato inconteste de que não há almoço grátis.


Ilustração: coisasamenosbr.blogspot.com