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terça-feira, dezembro 30, 2014

A sombra da retrospectiva de 2014

Que retrospectiva se pode fazer de 2014? Em termos de fatos não se pode dizer que não tenham existido muitos, embora, de fato, o Brasil viva mais de marketing, de escândalos e manchetes do que de qualquer outra coisa. Foi um ano do qual não se pode falar sem citar dois momentos que galvanizaram a atenção dos brasileiros e, por incrível que pareça, ambos marcados por duas grandes decepções: a Copa do Mundo e as eleições. Da Copa não se precisa falar grande coisa na medida em que os expressivos 7x1 são uma clara demonstração de que não somente perdemos, mas, que perdemos vergonhosamente. As eleições não são tão claras, todavia, um exame acurado mostra que foi outra vergonha imensa: os mais pobres e os menos escolarizados, por uma opção imediatista, por pressão, ou mesmo por utilitarismo, escolheram o caminho de mais do mesmo, ou seja, tentarmos manter a ilusão de que é possível ter dias melhores sem esforço, sem trabalho, sem educação e sem um projeto de futuro.
Não entro pelo caminho da corrupção, nem pela estigmatização do PT ou mesmo pelo evidente uso (e abuso) da máquina pública que, se não é nada recente, não justifica quem ganhou o poder em nome da mudança dos costumes. A questão, para mim, é mais ampla. É o fato de que já se havia comprovado amplamente que não se faz desenvolvimento via consumo (embora consumir mais seja um sinal de desenvolvimento), porque consumo é o caminho da procura e desenvolvimento (que, necessariamente, requer crescimento) é um caminho que só se trilha via oferta, via investimentos. A fórmula petista (aliás, gerada mais pelo acaso do que por um pensamento econômico construído) teve seus méritos ao utilizar o crescimento do crédito (em especial de longo prazo) como forma de aumentar o consumo. E foi, por longos anos, um instrumento para dar à impressão que se melhorou a renda e criar uma demanda real maior, mas, alcançou seus limites no endividamento e na falta de um ambiente econômico saudável que pudesse criar mais e melhores empresas e empregos (não os de baixa renda e distanciados dos setores produtivos de maior inovação).
Com os programas sociais diminuindo a procura por empregos se criou a ficção de ter encontrado o caminho mágico de distribuir renda e gerar desenvolvimento a partir do governo e, pior ainda, que o governo tudo pode. Para manter esta ficção (e o poder que ela confere) valeu tudo na última eleição e continuará valendo pelo resto do 2º mandato de Dilma. Porém, que futuro isto nos aponta? Não será, decerto, o futuro prometido, no passado, pelo ministro Mantega que nos prometia 15 anos de crescimento a taxas de 5%. O que vemos, no momento, é a recessão técnica da qual saímos para, quem sabe, crescer 2% no próximo ano. Isto se não fizerem o que vem fazendo, sistematicamente, e não afastam a possibilidade de voltar a fazer, de aumentar ainda mais os impostos. Impostos que já se encontram entre os maiores do mundo e inibem, junto com uma burocracia infernal, os investimentos. De forma que optamos por gerar mais incertezas do que buscar o caminho da mudança. Não tem, portanto, por este caminho, nenhuma possibilidade de voltarmos a ser felizes como no passado. Nem mesmo a possibilidade mais de sermos endividados e felizes. Assim a retrospectiva, seja sob qualquer aspecto que fizermos de 2014, somente pode nos informar que continuamos onde sempre estivemos: empurrando os problemas com a barriga. E que há razões fundadas para pensar que 2015 tende a ser pior que 2014. Não é nada certo, mas, é uma projeção razoável da retrospectiva.


Ilustração: dorescronicas.com.br

quarta-feira, dezembro 24, 2014

Sentimento de Natal


É mais um natal. Os natais passam na nossa vida quase sem nos darmos conta. E, só depois de muito tempo, passei a compreender que cada natal é um natal diferente. Não que o natal mude, pois, na verdade, quem muda somos nós, quem muda são as condições do mundo, da economia, da vida. Não desejo ficar nostálgico nem olhar para o passado, porém, não há jeito. Para quem, igual a mim, carrega muitos natais nas costas, um olhar retrô é imprescindível, inescapável, fatal mesmo. E, por menos que se deseje negar, o natal, realmente, não é mais o mesmo. Também pudera! Qual o natal de comparação? Falar que o natal mudou, como numa série histórica, é preciso que se fixe uma base, um natal que sirva de comparação, uma espécie de natal padrão.
Esta é a grande dificuldade. Se examino o passado, constato, sem muito problema, que, de fato, o natal era diferente. Havia, no passado, uma religiosidade, talvez exagerada, que cercava a data. O natal do passado, do passado dos meados dos anos 60, 70, era um natal que exigia um longo tempo de preparação. Havia todo um ritual de compra dos presentes, das roupas, das ceias. Era, numa má comparação, um carnaval religioso para o qual se passava longo tempo nos ensaios. E a missa do galo era o ápice e o fim de toda a festa. Depois dela já não havia o que fazer, senão dormir e pensar no outro natal. Bem, é preciso acentuar que os natais do passado eram verdadeiros banquetes. Lembro-me que se comia e bebia de forma pantagruélica, abismal mesmo, no melhor estilo dos grandes abades, aqueles que apareciam nos rótulos sempre gordos, rútilos, eternos bebedores dos melhores vinhos, apreciadores dos melhores chocolates e bolos. Eram natais, por assim dizer, religiosos e, ao mesmo tempo, festivais de gula, onde o comércio aparecia de forma secundária. Não se dava, como se dá, na atualidade, uma predominância para o faturamento, as vendas. Hoje Natal bom passa, invariavelmente, por lojas cheias, por consumo, pelo tilintar dos caixas.
A mudança foi imperceptível, mas, com um impacto estrepitoso. O mundo se acelerou. Foram as mensagens, os transportes, as mercadorias, as pessoas e o dinheiro ganhando velocidade. E, de repente, estamos num natal onde tudo parece, como o tempo, digital. As cartas, os cartões de natal, que, no passado, marcavam a chegada do período são, hoje, lembranças dos antigos. O natal, agora, tem uma versão tipicamente digital e nos chega por e-mails, por cartões digitais, por imagens de internet e de televisão. Não há, a rigor, mais preparação para nada. E os símbolos natalinos, como as árvores, como Papai Noel, a ceia, os presentes, as próprias compras ganharam outro ritmo, outra forma de ser. É tudo regido pela pressa e pelos preços. No entanto, hoje, me peguei pensando que, com tudo isto, com tudo que se diz do comercialismo, da falta de sentido do natal, não é que acordei, feito criança que espera por brinquedo, meio alegre, meio envolvido pelo ritmo de natal. Não sei se foi o show, um dos mais fracos que já vi de Roberto Carlos, que me lembrou que o natal existe ou a família, que uma parte está reunida, mas, apesar de não ser o mesmo, estou aqui escrevendo e já pensando na ceia, em beber uma taça de champanhe, em lembrar que ( e olha que nem acredito muito nisto) centenas de anos atrás um menino veio para nos salvar. Enfim, o que quero dizer mesmo, é que o natal mudou sim, todavia, devo confessar, quando chega está época continuo a ficar ensimesmado, pensativo, comovido mesmo. Talvez seja porque sejamos eternas crianças que estamos sempre esperando um presente de natal. De qualquer forma tenho que lhe dizer: Feliz Natal! 


domingo, dezembro 21, 2014

Luiz Gonzaga e Anastácia, o rei e a rainha


Por uma dessas felizes coincidências estava lendo o livro “Eu sou Anastácia-histórias de uma rainha”, da historiadora Lêda Dias, com a própria Anastácia (Lucinete Ferreira), editado pela FacForm do Recife, na mesma semana em que a TV Globo veiculou “Gonzaga- De pai para filho”, sobre a trajetória de Luiz Gonzaga e Gonzaguinha, seu filho. É muito prazeiroso, como nordestino, estar assistindo, mesmo que por um tempo breve, homenagens que são feitas a verdadeiros ícones nordestinos (e brasileiríssimos, por sinal) como são Luiz Gonzaga e Anastácia. Um dos pontos fortes, por exemplo, do livro de Anastácia é, justamente, o fato por seu depoimento amplamente demonstrado, que jamais cultivou, como é usual hoje, o marketing, a busca de se tornar um ídolo, uma estrela. Caminho diferente não trilhou Luiz Gonzaga, que sempre foi o que foi, um operário musical com enorme talento. Luiz se tornou uma lenda muito mais pelo trabalho contínuo, por sua forma de ser e de se comportar, como um sanfoneiro, um artista de sua terra do que qualquer outra coisa. Anastácia, que não teve tanta fama, é sua face feminina. Ele foi uma “Anastácia de calças”; ela, um “Luiz Gonzaga de saias”. Ambos, artistas insuperáveis que percorreram o Brasil, ainda no tempo dos circos, levando beleza e alegria aos rincões mais longínquos de nosso país.
Se, no filme, o destaque está para a vida, nem sempre em linha reta, de Gonzaga e a tumultuada relação familiar, em especial com o filho, o que se destaca no livro de Anastácia é sua coragem, sua ousadia, sua alegria de viver, que se esparrama mesmo nas piores situações. Em ambos as criações tomamos contato com a figura real de Luiz Gonzaga, uma pessoa generosa, mas, ao mesmo tempo, casmurra, com certos padrões nordestinos antigos entranhados que, hoje, seriam considerados “preconceitos”, porém, que revelam os padrões éticos e o caráter de uma certa época, mesmo que com suas contradições, na medida em que não somos perfeitos. Mas, é a humanidade dos personagens, suas qualidades e defeitos que o tornam ainda mais louváveis. Ser artista jamais foi fácil e, ser capaz de ter destaque no meio, exige certos sacrifícios que só compreende quem os enfrenta, embora, hoje, o sucesso, seja, aparentemente, uma coisa mais fácil de ser conquistada.

Todavia, o que se destaca nas figuras de Luiz Gonzaga e de Anastácia não é, simplesmente, o sucesso. É o fato de que se tornaram símbolos, exemplos de trabalho, de determinação, de permanência, de qualidade. São padrões que, de uma forma ou de outra, estão presentes no imaginário popular por sua importância e representatividade. Muitos outros existem que trilharam os mesmos caminhos. Impossível, por exemplo, não lembrar de Marinês, de Jackson do Pandeiro, de João do Vale, de Waldick Soriano, de Genival Lacerda, do Trio Nordestino e do próprio parceiro maior de Anastácia, Dominguinhos. São nomes de pessoas, entre muitas outras, que, no Brasil do passado, enchiam os circos de plateia, levavam multidões aos auditórios de rádios e televisões, encantavam cantando nas ruas, se necessário. São artistas que, em Luiz Gonzaga e Anastácia, tiveram representantes máximos do forró, do baião, do maxixe, de canções de amor e de sofrimento que marcaram e marcam a alma nordestina. Luiz e Anastácia, são, de formas diferentes, os expoentes máximos de uma época, embora ele o seja pelo todo de sua obra e ela, pela sua capacidade de transformar em canções a vida de seu povo.  

sábado, dezembro 06, 2014

A fé que nunca se acaba


Parece, hoje, até brincadeira, mas, a grande verdade é que, quase, mas, quase mesmo, fui um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores em Rondônia. Na época era muito amigo, e compartilhava as ideias de esquerda, de muitas pessoas com as quais até mesmo criamos um centro, que editou uma única revista e promoveu um único seminário, para discutir as eleições e as ideias vigentes. É certo que já sabíamos dos problemas políticos do socialismo, porém, nem o muro de Berlim havia caído, nem, como veríamos depois, todo socialismo pode ser tudo menos democrático, na medida em que o estado passa a tudo gerir o que, de partida, exige um partido único e a obediência cega aos governantes. Fora disto não há socialismo possível, de vez que o estado tem que organizar a economia. Não participei do PT por já, naquela época, ter um membro do partido caído de paraquedas para comandar os locais.
Bem, mas, isto é passado. Importa dizer que, naquele tempo, havia fé. A fé na revolução operária. A fé, vinda de uma teoria que tinha razão de ser na época da produção industrial, das massas compactas de operários. O tempo, e a falta de base da teoria de produção marxista com o fim da teoria do valor trabalho, reduziram o edifício teórico compacto de Marx a ruínas que, os seus crentes, procuram remendar sem sucesso. Uma teoria geral da sociedade, do movimento, como sonhou o velho sonhador alemão, é uma utópia irrealizável. Assim, quem pensa, quem raciocina, sobre a realidade concreta ou, como queiram os marxistas, sobre as “condições objetivas” não tem outro horizonte que não o capitalismo que, pode ser melhor, ou pior, de acordo como se organiza a sociedade. Esta é a realidade. Ser esquerda, esquerda moderna, hoje, é desejar promover a inclusão e não o sonho caduco dos Ches, dos Chavezs, dos Fidels da vida, que são múmias ambulantes do pensamento, pré-históricos mesmo.

Por mais que os petistas neguem é este o sonho último que os alimenta. Basta ver a admiração e os afagos deles a pessoas como Putin, Castro, Maduro et caterva, para colocar ao sol o amor nutrido por totalitarismos. Acontece que a riqueza para existir precisa ser gerada. E governos não geram riquezas. Administram o que retiram da sociedade através de impostos. É muito bonito falar em direitos, porém, não há almoço grátis. E o PT prega o almoço grátis para todos. É correto dizer que o partido tornou universal um programa de assistência social cuja abrangência não era satisfatória. É fato também que o PT, por outros interesses até, incentivou o crédito ao consumo, que possibilitou a muitos a aquisição de bens de consumo. Porém, é melhor parar por aí. A ideia de que o PT melhorou a vida do país é mero efeito de marketing. A dívida pública, de R$ 4,4 trilhões bate recorde histórico, o país perdeu participação no mundo, o governo Dilma é o de menor crescimento da história, mas, o pior é a perspectiva de futuro (até esqueço a corrupção alastrada). A verdade é que ambientes que criam riqueza necessitam de estabilidade e de contraditório. Não o do “nós x eles”, o de dividir para conquistar. Como ter um ambiente propício ao contraditório tentando impor um discurso único como o PT deseja? Como vai se estimular o consumo, sem aumentar a produção, como distribuir riqueza, e não criá-la? Onde o estado é um ente centralizador o que se cria é pobreza. Das duas uma: ou há uma enorme fé no equívoco, na dogmática certeza de que o estado é o caminho para criar riqueza ou estamos, contra todas as teorias econômicas, utilizando uma receita que incentiva o consumo, mas, não dá a mínima atenção à criação da riqueza, o que é um amadorismo imperdoável. Queiram, ou não, os petistas não há salvação fora do mercado. E se as regras do jogo mudam durante o jogo quem vai querer jogar para perder? E mudar as regras sem a atenção ao prejuízo alheio é o que os governos do PT mais tem feito. O resultado é o que temos visto: menos investimentos, crescimento pífio, descrédito no governo. E, enquanto houve um crescimento geral dos países emergentes, na primeira década do século XXI, nós continuamos a patinar sem um horizonte visível de melhores dias. E é bem possível, muito provável até, que com qualquer outro partido político governando, com ideologia que não seja igual ou pior, com certeza, o padrão de vida geral tivesse melhorado muito mais. Claro que não adianta discutir isto com os religiosos petistas. Eles acreditam em Lula e Dilma contra todas as coisas e fatos. É a fé que nunca se acaba.