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quinta-feira, outubro 13, 2011

Chico Buarque e a inocência humana


Em primeiro lugar devo dizer que sou um fã de Chico Buarque. Aliás, de longa data quando um velho e grande político do Ceará, Paulo Sarasate, que era dono do jornal “O Povo” e um homem de cultura, louvou fazendo política a música “A Banda”. Era, é, um primor de letra e música e, ali, já se anunciava a genialidade do compositor e letrista. Repetem, e é verdade, que nenhum poeta conseguiu ir tão fundo na alma feminina e, confesso, minha inveja de certos versos que qualquer um gostaria, se pudesse, ter feito. O poeta Chico Buarque é um talento indiscutível. O poeta, porém, não se separa do homem. E o homem envelhece, perde a sintonia com seu tempo, tem as fraquezas e os desejos demasiados humanos.
Chico, que já foi uma unanimidade, esqueceu a música e fez romances. Seus romances me lembram a música “Construção”, uma música perfeita, mas, que possui uma arquitetura que mostra os andaimes da construção, deixa ver o trabalho da elaboração e, se mostra grandeza, acaba por não parecer real. Os livros de Chico são bons, diria que quase ótimos, porém, ao fim, difíceis, exercícios de elaboração, que deixam a desejar diante da obra do poeta mór, do compositor inspirado e múltiplo. Talvez não tenha sido uma opção errada. Quem sabe, amanhã, num país mais culto, com pessoas mais cultas do que sou, as suas obras venham a ser mais importantes do que me parecem. Hoje não. Hoje parece que esqueceu o que sabia fazer tão bem e nos deixou órfãos de belas canções e conseguiu mesmo ser um pouco esquecido.
E Chico também tem uma ingenuidade que transparece nas suas letras. Não que também não seja maldoso, mas, há nele o paradoxo de ser maldosamente inocente. Também na vida, como num episódio em que se envolveu com uma amada nas praias, ou em pensar que é possível opinar livremente sobre política sem ônus ainda mais quando se é um privilegiado num país que está dividido em todos os sentidos. Chico foi um ídolo, um ícone, um tocador da manada quando era contra a ditadura. Num país de múltiplas opções ficar ao lado do poder sendo egresso da elite, e podendo ter apartamento em Paris, é se colocar como alvo, ainda mais quando seu posicionamento político ajudou a irmã a alçar voo para um ministério.
Agora lançou um disco denominado Chico (Biscoito Fino). O primeiro, depois de cinco anos, recebido apenas com críticas e suas novas canções não tocam, nem em canais de internet, televisão e dá trabalho encontrar saber quais as faixas de suas canções, exceto para quem comprar os CDs que sobram nas lojas. E só deram atenção a um verso que fala em “mulher sem orifício”. Uma pena. O CD de dez faixas é de excelente qualidade. O problema é que Chico, um homem de elite, esteve ajudando com seu apoio à incentivar a falta de cultura. Num vídeo se assombra que tem pessoas que falam mal dele na internet e o chamam de “velho bêbado” quando nem bebe. A verdade, para muitos, é que se comportou como se bebesse, e, se suas canções não produzem o mesmo impacto é, justamente, porque até mesmo os que, hoje, estão no poder, na sua grande maioria, são incapazes de compreender (e sentir) a beleza de seus versos. A indiferença vem de que a grande massa gosta dos baticuns ou do barulho do rock ou até mesmo da batida de trilho das grandes bandas e seu público, igual a ele, envelheceu e não conta mais. Chico, infelizmente, esteve distante do país e ainda vive ao som da bossa nova e crê no homem cordial. A violência para ele só chegou pela internet. Pelo menos, o salva fazer ainda belas canções para o futuro. Neste momento, é cercado pela indiferença dos amigos e pela pena de muitos fãs que gostariam que tivesse permanecido sendo apenas o grande poeta que sempre foi. A pena não é de que ele esteja sozinho, mas, que não tenha se limitado a torcer pelo Fluminense e jogar bola pelo Politheama. A pena é de que tenha se equivocado tanto sem ter percebido que estava se enterrando em vida. Talvez seja um caso exemplar de auto-engano. Ou a maldição de que nossos maiores compositores, igual ao país, não encontrem jamais a felicidade.

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