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sexta-feira, março 04, 2011

Quando o carnaval passar


Com a morte de Manelão o carnaval de Porto Velho ficou mais triste, com certeza. O notável chaveiro não era somente o carnaval, e há muitas histórias para provar que se tratava de um personagem que desafiava a lógica, todavia, foi uma espécie de carnaval que levou com ele no enterro mais alegre que os trópicos já viram. Pena que não possa ter visto seu enterro, uma consagração. O enterro de Manelão foi também o enterro de uma época de carnaval romântico de Porto Velho, que já vinha se esvaindo em sangue. Manelão foi feliz na sua morte. Morreu na hora certa, bem próximo do carnaval, que tanto amava, e ainda teve condições de pedir que fizessem, por ele, mais carnaval. Foi um excelente carnavalesco e melhor ainda chaveiro tanto que abriu as portas do céu na hora certa.
Não é somente por termos sidos amigos e contemporâneos que considero que, daqui para a frente, o carnaval de Porto Velho e da Banda do Vai Quem Quer será outro carnaval. É que Manelão agregava em torno de si as mais diferentes pessoas e sabia com sua forma peculiar lidar com todos com uma competência social digna de um líder. Podem falar tudo dele, louvar, esquecer, lembrar feitos e mal feitos, porém, foi sua determinação e sua vontade férrea que fizeram da Banda o que ela é: um símbolo da nossa grandeza e dos nossos desacertos. Ela, mais do que qualquer outra instituição, somos nós, os rondonienses, esses cidadãos confusos, criativos, belos, ricos ou pobres, contudo, sempre desajustados, sempre procurando a fantasia de mudar o mundo de qualquer forma. Na ignorância, na marra, no peito, na base do uísque, da cachaça ou da caipirinha, não há nada que nos salve de nos reconhecermos, quando nos olhamos no espelho, como os verdadeiros Macunaímas.
A realidade, no entanto, é que os heróis do passado, como Manelão foi, eram delicados e românticos. Criaram um carnaval onde as pessoas se conheciam, se reconheciam, se amavam, apesar dos defeitos, e, mesmo quando se odiavam, sabiam que eram parte de uma comunidade, de um lugar e de um tempo, por isto, incapazes de violência. Hoje somos os heróis desgarrados, os heróis cuja pátria é a internet, os pingentes “das usinas”, que produzem luzes e o futuro, enquanto morrem sob as rodas do trânsito caótico, da violência das doenças, das armas que invadem também o carnaval e se transforma, pasmem, em tiros que roubam vidas jovens. Não. Não se trata de nostalgia, porém, de verificar que, agora, sair para brincar é também desafiar o risco de uma bala, de uma faca, de um acidente, de não voltar. Manelão se foi e está mais presente do que nunca no carnaval. Eu que fiquei nunca estive tão distante. Se antes esperava, me guardava, para quando o carnaval chegar, agora, fico esperando ver o carnaval passar.

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