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terça-feira, novembro 15, 2011

A podridão está no cerne da maça

Com um livro grande, inclusive no número de páginas, Archie Brown criou uma obra provocadora (Ascensão e Queda do Comunismo, Editora Record), na medida em que procura examinar as razões pelas quais o comunismo, com o desmanche da União Soviética, se tornou uma peça de museu, embora ainda suas viúvas persistam em chorar lágrimas sentidas e ter a fé inabalável de que o fantasma um dia há de voltar. Interessante, sob o aspecto histórico e documental, o livro defende uma tese até certo ponto aceitável, a de que “a reforma produziu a crise”, ou seja, que foi uma escolha, supostamente errada, de Gorbachev, caracterizado como um político ingênuo, que acelerou a dissolução do regime. É certo que a “perestroika” teve uma imensa participação com a condução decisiva de Gorbachev, bem como que o regime seria forte o suficiente para permanecer intacto por muito mais tempo, contudo, até usando o próprio pensamento marxista, cada época somente gera os problemas que pode resolver. Em outras palavras Gorbachev foi uma resposta às fragilidades do modelo: a falta de liberdade e a paralisia. Corroído, como Brown constata, pela ineficiência, pela estagnação e pela incapacidade de, tecnologicamente, entrar na era da informação.
Interessante é a constatação do Autor de que o comunismo acabou ao mesmo tempo em que não deseja admitir que a tirania dos regimes soviéticos é um subproduto direto do marxismo. Sua expressão concreta. Marx, e seus seguidores, concordariam plenamente com a afirmação de que o Estado não é uma entidade imparcial e superior à sociedade, não é um juiz que arbitre serenamente o jogo conflituoso dos interesses econômicos, gerindo o bem comum. Ele não é o representante de interesses superiores aos interesses particulares. Para eles, na verdade, o Estado sempre foi um dos instrumentos mediante os quais a burguesia, a classe dominante, impõe a lei da sua vontade e do seu interesse ao proletariado. Ora, Marx chegou a escrever que “O Estado não é a realização do homem, mas, a sua alienação”. Isto parece completamente contrário a uma sociedade que é dominada pelo Estado! A rigor, seguindo seu pensamento, um Estado completamente estatal seria a alienação completa e, como não é uma entidade imparcial, sempre serviria a alguns interesses. Somente se precisa olhar para o passado para verificar que sim. E, para o presente, vendo o que resta que assim continua.
À parte do livro, que é um instrumento para a reflexão, o que se vê é que o marxismo como forma de pensar está ultrapassado. Não se precisa discutir suas bases, nem a genialidade de Marx, para perceber que era uma teoria única e totalizante, redutora da vida e da história, que exigia e impunha uma solução única e que não deixa espaço nem para a democracia, nem para a liberdade. Marx, que se pregava um democrata, criou uma religião sustentada por uma meia ciência em que, mesmo que tudo aponte para o contrário, a inabalável fé de que o socialismo triunfará, que pode ser sustentada por qualquer crise, sempre se sustenta da esperança no futuro e da repetição de frases de um pseudo-conhecimento que se justifica pela desigualdade social. Mais do que nunca a defesa dos “pobrezinhos”, a ditadura do politicamente correto e o uso gramsciano da hegemonia se justificam por si mesmo, de vez que não há justificativa científica mais para a farsa da revolução socialista.
Qualquer pensador de meia-tigela há de convir que, se a democracia formal, com todos os seus defeitos, não é um primor de liberdade, muito menos o será uma sociedade na qual o partido e o pensamento único vicejam. Como falar em democracia e em povo sem liberdade de escolha? Aqui vale lembrar que ninguém menos que Rosa Luxemburgo afirmou que “Liberdade é, apenas e exclusivamente, a liberdade dos que pensam diferente”. E isto, decisivamente, não é possível sob o comunismo ou qualquer tipo de socialismo real que são, tipicamente, sociedades de comando. Em suma, a podridão da maça está no seu recheio. Não foi o comunismo real uma distorção da teoria marxista, mas, sim sua realização e, por isto, quem a prega deve falar em ditadura simplesmente, pois, do proletariado não tem nada.

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